domingo, 12 de abril de 2015

Salinas - os jardins de sal

No extremo meridional do Algarve, em Castro Marim, o Guadiana, o oceano e o homem esculpiram os sapais donde emergem as salinas. Esta teia complexa de canais e pequenos espelhos de água espraia-se por mais de 300 hectares através de dois concelhos, Castro Marim e Vila Real de Santo António, sobre um solo argiloso compactado por séculos de labor humano, formando um verdadeiro prado marinho, pontuado por “jardins de sal”. Preservados pelo saber tradicional, intemporais, os instrumentos e gestos de recolha mantêm uma ligação harmoniosa com a natureza. O balancear das marés, as brisas de levante, os diferentes viveiros e cristalizadores, a recolha manual quotidiana, a dimensão humana das explorações expressam na modernidade, a tradição milenar.

Actividade milenar em Portugal, as primeiras referências à produção de sal marinho remontam ao séc. VIII a.c. com a introdução, pelos Fenícios, da indústria de conservas de peixe baseada na salga em tanques; as marés, praticamente inexistentes no Mediterrâneo, permitiram aqui, no Algarve Ocidental, a instalação de grandes áreas de salinicultura. Foram, contudo os romanos a introduzir o reticulado em esquadrias na região de Castro Marim, o­nde também teria sido produzido o famoso “garum”. Portugal sempre foi um país produtor e exportador de sal, tendo já sido esta uma das principais actividades económicas do país. O sal era, na Idade Média, produto de troca com todo o Norte da Europa e até com o Norte de África.

A salinicultura tradicional foi uma actividade humana estruturante do litoral algarvio, constituindo Castro Marim actualmente, o núcleo mais representativo, não só por constituir uma unidade geográfica bem definida, mas também porque nele persiste a maior comunidade de salinicultores artesanais. O sector salineiro atravessou várias crises, ao longo dos séculos, motivadas por políticas desfavoráveis e crises económicas internacionais que levaram à falência das indústrias conserveiras. No entanto, é nos anos 70, que se assiste ao acentuado declínio da actividade, devido aos custos da mão-de-obra e ao sucesso da conservação a frio. O abandono de muitas unidades tradicionais, a sua reconversão em aquaculturas e explorações mecanizadas modelaram a nova paisagem.

As salinas, embora sejam um habitat artificial, são de grande valor para as aves aquáticas, permitindo um equilíbrio notável entre o aproveitamento económico de um recurso e a conservação de valores naturais. Ao interesse paisagístico das salinas, acresce o facto de constituirem verdadeiros santuários de biodiversidade mercê das diferenças de salinidade, profundidade e formações vegetais que se encontram no seu interior, permitindo a coexistência, numa área relativamente confinada, de grande variedade de organismos da base da cadeira trófica. Este facto é explorado pelos grupos situados em níveis superiores, particularmente as aves, para as quais as salinas possuem ainda o atractivo de não sofrerem a influência do ciclo diário das marés, oferecendo-lhes portanto condições de alimentação e abrigo particularmente vantajosas.


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